Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Gaspar Vianna
Formação acadêmica
Ciências, Letras e Medicina
Área de atuação
Histologia
Anatomopatologia
Protozoologia e Micologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Secção de Anatomia Patológica do Instituto Oswaldo Cruz
Informações Biográficas

O texto completo foi elaborado a partir das informações contidas no livro “Gaspar Vianna: gênio paraense da medicina”, de autoria do médico Habib Fraiha Neto. O documento está citado nas referências bibliográficas.

Gaspar de Oliveira Vianna nasceu em Belém (PA) no dia 11 de maio de 1885. Seu interesse pela Medicina iniciou-se ainda quando cursava o ensino secundário no Ginásio Estadual Paes de Carvalho. Aos 18 anos, já era bacharel em Ciências e Letras, com título de agrimensor.

Quando Gaspar Vianna nasceu não existiam ainda cartórios de registro civil no Brasil. Era a Igreja que registrava tudo, por ocasião do batismo da criança. Segundo o Prof. Arthur Napoleão Figueiredo, bom amigo já falecido, autoridade no assunto, somente com a Constituição de 1891 foi criado o Estado Civil e, com ele, o Registro Civil. Isto haveria de gerar muitos equívocos quanto a datas de nascimento, inclusive de personalidades históricas. No caso de Gaspar, a data de 1885 era considerada verdadeira por seus biógrafos, baseados no conhecimento dos dados registrados em sua carteira de identidade.

Órfão de pai em pouca idade, cresceu sob o desvelo de sua mãe e de duas irmãs, e a tutela do irmão mais velho, o ilustre jornalista Arthur Vianna, meticuloso historiador da Santa Casa da Misericórdia Paraense, das epidemias no Pará e de outros temas de não menos interesse regional. Sob a lúcida orientação do irmão, que o criou como a um filho muito amado, Gaspar foi aluno secundarista do tradicional Lyceu Paraense, depois Ginásio Estadual Paes de Carvalho e, aos 18 anos incompletos, já bacharel em Ciências e Letras e com o título de agrimensor, transferiu-se para a capital federal a fim de estudar Medicina, posto não existir ainda uma escola desse gênero no Pará.

Em 1903, Gaspar Vianna muda-se para a capital com a finalidade de iniciar seus estudos na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. No segundo ano do curso, suas habilidades em preparações histológicas foram percebidas por seu mestre de Histologia, Eduardo Chapot Prevost, ganhando destaque e notoriedade entre os alunos e os professores da Faculdade. Já na segunda série, porém, despontaria com toda a pujança de seu talento. Aluno do afamado mestre de Histologia, Eduardo Chapot-Prévost, conquistaria do exigente e austero professor a nota máxima, graças à extraordinária aplicação e à rara habilidade nas preparações histológicas, de que resultaria a organização de impecável coleção de algumas centenas de lâminas, que o mestre lhe haveria de pedir deixasse para a cátedra

Ainda estudante, Vianna estruturou um laboratório de Análises Clínicas no Centro do Rio de Janeiro, no Largo da Carioca onde lecionava, em caráter particular, Histologia para alunos da Faculdade de Medicina. Lauro Travassos e Magarinos Tôrres foram alguns de seus alunos, que se tornariam igualmente grandes cientistas do Instituto Oswaldo Cruz. Neste mesmo período, integrou o corpo de profissionais do Hospício Nacional de Alienados como assistente do Laboratório Anátomo-Patológico, e ao lado de Bruno Lôbo, publicou o livro “Estrutura da Célula Nervosa”.

Ao fim do curso de Medicina, Vianna apresentou a tese intitulada "Estrutura da célula de Schwann nos vertebrados", graduando-se em 1908 com nota máxima.

Em 1910, Gaspar Vianna foi convidado por Oswaldo Cruz para assumir a direção da Secção de Anatomia Patológica do Instituto de Manguinhos. Durante seu tempo no Instituto, foi responsável pela caracterização anatomopatológica da Doença de Chagas, descobriu formas de lesihmanióides do esquizotrípano (Trypanosoma cruzi) em tecidos de hospedeiros vertebrados e realizou diversos outros estudos importantes. Dentre eles, destacam-se pesquisas em torno do ciclo evolutivo dos tripanossomas gambiense, equinum, congolense e equiperdum. Além disso, constatou uma nova espécie de leishmania, na qual denominou de braziliensis.

Mas o grande feito de toda a sua vida terá sido mesmo, aos 27 anos, a descoberta da cura da leishmaniose tegumentar. Animado pelo conhecimento da ação do antimônio em certas tripanossomíases do Velho Mundo, tal como nas formas cutâneas da doença do sono, decidiu experimentar o tártaro emético na úlcera de Bauru. A droga estava, há séculos, proscrita das farmacopeias, dados os inúmeros acidentes a ela atribuídos. Resolveu, porém, testá-la com mais prudência, bem diluída (a 1%) em soro fisiológico, administrando-a por via intravenosa. Os resultados foram surpreendentes. Comunicou-os em reunião da Sociedade Brasileira de Dermatologia, por ocasião do VII Congresso Brasileiro de Medicina e Cirurgia, em Belo Horizonte, abril de 1912, data hoje considerada histórica dessa notável conquista científica. Com a cura da leishmaniose tegumentar, de tão grande repercussão, desbravava ele os caminhos da utilização dos sais de antimônio na terapêutica de graves enfermidades, endêmicas em várias partes do mundo, tais como o calazar e as esquistossomoses.

Na área de Micologia, Vianna constatou uma nova espécie de blastomices em parceria com o Prof. Dr. Miguel Pereira, e ao lado de Dr. Sylvio Moniz descreve um caso de discomicose pulmonar e cutânea. Destaca-se também a descoberta feita por Gaspar Vianna de uma nova micose, causada por um cogumelo ainda não identificado, o Proteomyces infestans.

Em 1913 conquistou, por concurso, a livre-docência da cátedra de Anatomia Patológica da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, apresentando um estudo original sobre as lesões apendiculares na blastomicose sul-americana, enfermidade ainda confundida com a coccidioidomicose, ou moléstia de Posadas-Wernicke; o trabalho considerado fundamental, de Gaspar Vianna, no campo da Micologia. Em seguida, foi nomeado para reger, interinamente, a cátedra de Histologia da Escola Superior de Agricultura e Veterinária do Rio de Janeiro, vinculada ao Ministério da Agricultura.

O médico e cientista Gaspar Vianna foi eleito o Paraense do Século XX na promoção realizada para comemorar os 25 anos da TV Liberal em 2001. Gaspar Vianna foi um dos maiores pesquisadores no campo da medicina. Ele produziu diversos trabalhos em menos de seis anos de profissão, passando dias e noites incansáveis de estudo no Instituto Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. Suas pesquisas se estendiam a vários campos, como a Histologia, Protozoologia, Zoopatologia, Micologia e Anatomopatologia. Nos poucos anos dedicados à pesquisa médica, conseguiu deixar um legado inestimável para a humanidade. 

Aos 29 anos, no dia 14 de abril de 1914, durante a autópsia de uma mulher com óbito causado por tuberculose pulmonar, Gaspar Vianna é, acidentalmente, exposto pelo líquido presente na cavidade torácica. Assim, Vianna é contaminado, e em poucos dias, passa a desenvolver sintomas de tuberculose miliar aguda, falecendo 2 meses após o incidente.

Referências Bibliográficas

ELOGIO a Gaspar de Oliveira VIANNA, patrono da cadeira número 25 [...]. [Belém, PA: Academia de Medicina do Pará], 1989.

FRAIHA NETO, Habib. Gaspar Vianna: gênio paraense da medicina. Ananindeua, PA: Instituto Evandro Chagas, 2021. 362 p. il. ISBN: 978-85-60420-19-3. Disponível em: https://patua.iec.gov.br/items/12e7f753-db66-4d76-84fc-8731d08a7b1e/full.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Base Arch: Alcides Godoy. Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: https://basearch.coc.fiocruz.br/index.php/alcides-godoy-3.

FUNDAÇÃO PÚBLICA ESTADUAL HOSPITAL DE CLÍNICAS “GASPAR VIANNA”. Gaspar Vianna, o Paraense do Século XX. Blog Biblioteca FHCGV. Belém, 2018. Disponível em: https://bibliotecafhcgv.wordpress.com/gaspar-vianna/.

NECROLÓGIO I: Dr. Gaspar de Oliveira Vianna. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, v. 6, n.2, 1914, p. 68-69.

REZENDE, Jofrre Marcondes de. Gaspar Vianna, mártir da ciência e benfeitor da humanidade. In: REZENDE, Jofrre Marcondes de. À sombra do plátano: crônicas de história da medicina [online]. São Paulo: Editora Unifesp, 2009. p. 359-362. Disponível em: https://books.scielo.org/id/8kf92.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Alcides Godoy
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Infectologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Pesquisador do IOC
Informações Biográficas

O texto usado como fonte foi dos pesquisadores Dr. Octavio Coelho de Magalhães e Dra. Cristiane d'Avila. Os documentos estão citados nas referências bibliográficas.

Alcides Godoy nasceu na cidade de Campinas, em 7 de Janeiro de 1880. Esta cidade, como muitas outras, brasileiras, surgiu em época remota, quando as bandeiras saíram de São Paulo, em procura das Gerais e Mato Grosso. Os pais de Alcides Godoy eram Francisco Xavier de Morais Godoy e Ana Pureza de Campos Godoy, de cujo matrimônio nasceram Alcides, Adolfo, Artur, Augusto, Amélia e Avelino, dos quais somente sobrevivem os três últimos.

Aos nove anos de idade, viu a cidade entristecer-se com o aparecimento da epidemia de febre amarela. Esta doença, mais tarde, serviria às experiências celebres de Adolfo Lutz e Emílio Ribas. O surto amarílico daquela época só muito depois foi dominado. Em 1880 já havia em Campinas quatro colégios, sobressaindo o “Culto à Ciência”, no qual, um dia, Alcides Godoy estudaria os preparatórios.

No Distrito Federal, ele foi residir na “república” de estudantes à Rua do Riachuelo, tendo encontrado entre os goianos verdadeiros e leais amigos. Foi por esta época que se revelou lutador de têmpera rija e nobre, o caráter firme do filho de Campinas que, com os fracos proventos de seu cargo, manteve as cinco pessoas estremecidas no seu próprio lar. Em 1902 nós o vemos auxiliar acadêmico da antiga Diretória de Saúde Pública Federal, na campanha contra a febre amarela e trabalhando na Santa Casa, com Antônio Austregésilo. Em 1903, formando-se em Medicina, recolheu-se, com Henrique Aragão, à família de Manguinhos, da qual só se afastaria com a morte, em 1950.

Casou-se mais tarde com a Senhora Dulce Leite de Castro Godoy e deste casamento nasceram 2 filhos: Oswaldo - químico industrial e Margarida Maria — exímia pianista.

Na “Casa de Oswaldo”, galgou todos os postos, de auxiliar em 1903, assistente em 1907, biologista da classe “N” e professor da classe “O”, pela última reforma do Instituto Oswaldo Cruz, em 1949.

Na fazenda velha do Instituto Soroterápico de Manguinhos, ou na feitura do majestoso edifício que é o atual pavilhão central do Instituto Oswaldo Cruz, Godoy se revelou de um espírito atilado, original, renovador, e profundo, que conservou até o fim da sua vida. O mecanismo das estufas, a fabricação da água destilada, o funcionamento das autoclaves, a macro e microfotografia, as balanças, os novos aparelhos de pesquisa e dosagens, o preparo dos meios biológicos de cultura, tiveram sempre no mestre um conselheiro avisado, se não um renovador seguro, naquele magnífico “Manguinhos de outrora”. A Escola de Oswaldo Cruz muito deve ao seu enciclopédico saber.

Alcides Godoy não era um didata perfeito. Os pensamentos, sempre elevados, não eram expressos por ele com a clareza dos seus conhecimentos. A palavra não lhe era fácil e, para a explanação de um problema de pesquisa, dava, não raro, pela rapidez das deduções, o começo e o fim da questão, deixando ao principiante a descoberta do resto. Possuía, todavia, essa qualidade rara - a originalidade da pesquisa. Para o progresso real da ciência, não basta cultura vasta e profunda, não é suficiente conhecer com pormenores todas as técnicas, passadas e presentes, e muito menos trazer no cérebro esse amargo cepticismo dos vencidos. É indispensável possuir, além de tudo aquilo, entusiasmo, inabalável fé na ciência e, principalmente, esta faceta rara do espírito, de ver claro onde os demais se debatem nas trevas; de encontrar a verdade nova, onde quase todos só pressentem os desenganos. É essa qualidade excepcional da inteligência que permitiu a um Carlos Chagas, retirar da mata virgem de doenças tropicais, que era Lasance em 1909, a componente nova da tripanossimíase americana. Era essa mesma chama que alumiava o talento de Alcides Godoy, como de um Adolfo Lutz, para não falar senão de alguns mortos da escola de Manguinhos.

Em 1903, Oswaldo Cruz, já interessado em pesquisas sobre o carbúnculo sintomático, convidou o então estudante de medicina Alcides Godoy (1880 – 1950) para ingressar, como auxiliar acadêmico, no Serviço de Profilaxia da Febre Amarela da Diretoria Geral de Saúde Pública, a fim de trabalhar na produção de soros e vacinas. Nesse período, Cruz acumulava a função de diretor deste serviço e também do Instituto Soroterápico Federal (que viria a ser denominado Instituto Oswaldo Cruz, em 1908, e, posteriormente, Fundação Oswaldo Cruz). Atento às pesquisas em curso no exterior, Oswaldo Cruz já havia adquirido e consultado a obra de Arloing, Cornevin e Thomas. Incansável na busca por respostas, colocou os colegas do Instituto Ezequiel Dias e Rocha Lima para investigarem a moléstia, mas após 1905 Godoy tornou-se o responsável pelo projeto. Enquanto isso, Henrique da Rocha Lima, pesquisador e “braço direito” de Oswaldo Cruz, usando técnica aprendida durante uma estadia na Alemanha, obteve colônias anaeróbicas do germe, cedendo-as a Godoy para investigação científica.

Voltado totalmente à pesquisa, Godoy foi original: empregou um meio de cultura especial para bactérias anaeróbicas, com uso de glicose, a fim de obter uma “raça” diferenciada de bactérias de virulência atenuada, criando uma vacina com o Clostridium chauvoei. Logo que foram confirmadas, em laboratório, as propriedades vacinantes de suas culturas, Godoy viajou, em 1906, para Juiz de Fora, Minas Gerais, em companhia dos pesquisadores do Instituto Rocha Lima e de Carlos Chagas, para executar os testes finais. A primeira demonstração pública da vacina, entretanto, não obteve o resultado esperado e alguns animais faleceram. De volta a Manguinhos, Godoy descobriu a causa do insucesso: uma maior virulência do lote da vacina preparada para o teste. Corrigida a falha, novas inoculações foram feitas, desta feita com absoluto sucesso. A descoberta fez o então Instituto Oswaldo Cruz produzir e fabricar em escala comercial, a partir de 1908, a primeira vacina veterinária brasileira de combate a doenças infectocontagiosas. Um marco na história da veterinária brasileira e mundial.

É importante ressaltar que após a obtenção do registro da patente da vacina, Godoy efetuou uma escritura de cessão que transferia sua descoberta para o IOC, com o propósito de incentivar as atividades de exploração industrial do imunizante. A verba obtida com a venda da vacina auxiliou a instituição a cobrir gastos com o ensino, a pesquisa e a produção, sem submeter-se à burocracia governamental vigente, ao mesmo tempo em que representou um estímulo aos pesquisadores para o desenvolvimento de produtos biológicos a serem patenteados e vendidos.

O próprio Oswaldo Cruz, em função da repercussão e da originalidade do processo desenvolvido por Godoy, aconselhou-o a patentear em seu nome a invenção. A carta patente nº 5.566 foi obtida em 24 de novembro de 1908. A publicação no Diário Oficial se deu em 6 de dezembro daquele ano. Ainda em 1908, cedeu, por escritura pública, ao Instituto Oswaldo Cruz, representado por seu diretor Oswaldo Cruz, os direitos de exploração comercial do seu privilégio de invenção (a vacina contra a manqueira).

No mesmo ano de 1908, Godoy publicou, com a colaboração de Gomes de Faria (que havia sido recentemente contratado pelo IOC), um trabalho analisando as variáveis no meio de cultura que poderiam ter causado a maior virulência da vacina responsável pelos problemas em Juiz de Fora, confirmando-se que a concentração da glicose havia sido a responsável pela redução da virulência da vacina (aspecto que havia sido identificado e solucionado por Godoy naquela ocasião, em 1906).

Além de dedicar-se ao tema da manqueira, como sua atividade principal, Godoy desenvolvia outras atividades – como era de praxe entre todos os pesquisadores de Manguinhos –, como a produção dos soros antidiftérico e antitetânico, e na dosagem do soro antipestoso. Com Astrogildo Machado, desenvolveu, em 1918, outra importante vacina produzida e comercializada pelo IOC, contra o carbúnculo hemático. Outra frente importante de trabalho de Godoy em Manguinhos foi a criação de diversos dispositivos e aparelhos para facilitar e aperfeiçoar os procedimentos de produção, como o “frasco Dr. Godoy”, desenvolvido por ele para facilitar a coleta de mosquitos pelos “mata-mosquitos” que atuavam nas campanhas sanitárias.

Godoy foi também professor do curso de aplicação do Instituto, criado em 1908 para oferecer treinamento experimental nas áreas de microbiologia e zoologia médica e fez três viagens de estudo à Europa. Em 1912, foi enviado aos Laboratórios de Leipzig, na Alemanha, a fim de acompanhar pesquisas concernentes a questões de físico-química aplicada à ciência médica. Em 1919, permaneceu quatro meses na Europa; foi designado para esta viagem a partir da solicitação, feita a Manguinhos pela representação diplomática inglesa, para que algum médico embarcasse num navio inglês aportado no Rio cujo médico de bordo havia adoecido. Esta foi, conforme relatou certa ocasião, a única vez que exerceu a clínica médica. Finalmente, em 1925, esteve na Itália acompanhando Carlos Chagas no 1º Congresso de Malariologia, realizado em Roma, e para estudar os modernos processos de profilaxia da malária empregados naquele país.

Integrante do chamado “jardim da infância da ciência”, como Oswaldo Cruz carinhosamente chamava o grupo inicial de pesquisadores de Manguinhos, Godoy sempre gozou da confiança e apreço tanto de Cruz quanto de seu sucessor, Carlos Chagas, substituindo-os, várias vezes, em suas ausências, na direção do instituto. Faleceu em 30 de janeiro de 1950, aos 70 anos. Na década de 60 a família Godoy saiu da sociedade, que ficou com a família de Machado. A firma, que continua a fabricar a vacina da manqueira, foi vendida recentemente pelos seus descendentes e pertence hoje à empresa Bravet’.

Referências Bibliográficas

ARAGÃO, Henrique de Beaurepaire Rohan. Noticia histórica sôbre a fundação do Instituto Oswaldo Cruz (Instituto de Manguinhos). Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, v. 48, p. 1-75, 1950. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/52719.

BENCHIMOL, Jaime L. Manguinhos do sonho à vida: a ciência na belle époque. Rio de Janeiro: Casa de Oswaldo Cruz; Editora, 1990.

CHAMAS, Claudia. A propriedade intelectual e a vacina contra a peste da manqueira. Revista Brasileira de Inovação, v. 5, n. 1, p. 203-218, jan./jun. 2006. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/58023.

D’AVILA, Cristiane. Alcides Godoy. Rio de Janeiro: Brasiliana Fotográfica, 2021. Disponível em: https://brasilianafotografica.bn.gov.br/?tag=alcides-godoy.

GODOY, Alcides. Discurso na colocação da pedra fundamental do Monumento Nacional à Memória de Oswaldo Cruz por ocasião dos congressos133 médicos comemorativos do 1° centenário da Academia Nacional de Medicina. Revista Médico-Cirúrgica do Brasil. Rio de Janeiro, v. 37, p. 305-306, 1929.

GODOY, Alcides. Electrodiagnostico. 1904. Tese (Doutorado) - Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, 1904.

GODOY, Oswaldo. Primeira vacina veterinária desenvolvida e fabricada no Brasil completa 100 anos. Rio de Janeiro: Agência Fiocruz de Notícias, 2008. Disponível em: https://agencia.fiocruz.br/primeira-vacina-veterin%C3%A1ria-desenvolvida-e-fabricada-no-brasil-completa-100-anos.

MAGALHÃES, Octavio de. Alcides Godoy. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, v. 49, p. 1-6, mar. 1951. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/52765.

MORAES, Alice Ferry de. Informação e inovação na vacina da Peste da Manqueira. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n. 3, p. 97-103, set./dez. 2008.

TEIXEIRA, Luiz Antonio. Ciência e saúde na terra dos bandeirantes: a trajetória do Instituto Pasteur de São Paulo no período de 1903-1916. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 1995. 190 p. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/37553.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Ismael da Rocha
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Bacteriologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Bacteriologista do Instituto Soroterápico Federal
Informações Biográficas

Ismael da Rocha, filho de Francisco José da Rocha e de D. Maria Ritta Affonso da Rocha, nasceu em 11 de maio de 1858, na cidade de Salvador, no Estado da Bahia. Formou-se em medicina na Faculdade de Medicina da Bahia em 1879, e defendeu a tese intitulada “Da Contração Muscular, Doutrina das Forças Vivas”. Ao longo de sua trajetória profissional, dedicou-se à prevenção e cura da tuberculose e à medicina militar. Cumpriu a medicina de forma disciplinada, como um militar devotado sendo merecedor do título recebido de invictus labor. Foi convidado pelo Barão de Pedro Affonso para atuar como interino efetivo da Santa Casa de Misericórdia, nas quadras epidêmicas de 1878 e 1879, e prestou serviços nas Enfermarias Públicas de febre amarela.

Enquanto ainda estava se recuperando de um problema de saúde, em 1880 foi contratado pelo amigo o capitão Dr. José Bernardino Bormann, para atuar como médico da colônia militar do Chapecó, na fronteira as Missões Argentinas, ano que ainda se encontrava convalescente. Serviu durante cinco anos sucessivos, tempo em que se dividiu entre os deveres militares e o socorro médico à pobreza.

Em 1885, como integrante do Corpo de Saúde do Exército, foi nomeado Médico da Comissão de limites com a República Argentina. Seguia ordens do Barão de Capanema e exerceu o cargo durante três anos. Foi promovido por merecimento ao posto de Capitão em 1889, sendo chamado ao Rio de Janeiro pouco após o advento da República. Foi também convidado a exercer o cargo de Assistente, onde permaneceu até a reforma do Dr. Antonio de Souza Dantas. Promovido a major a 11 de outubro de 1891, foi nomeado para estudar na Europa o tratamento da Tuberculose Pulmonar, acompanhando os estudos do Professor Koch, naquele momento em máxima evidência científica.

Após essa experiência, escreveu um livro relatando os estudos do Professor Koch, que intitulou “A Tuberculina de Roberto Koch ou o Tratamento Biológico da Tuberculose”. Essa publicação, recebida pela classe médica com muito interesse, deu-lhe ingresso na Academia Nacional de Medicina na condição de Membro Titular.

Quando foi a Madri, visitou o Hospital S. Juán de Diós, e ficou impressionado pela beleza de sua arquitetura e organização, obteve, então, cópia da planta geral dessa instituição, oferecendo-a ao Ministro da Guerra. Por essa quadra o Marechal Floriano Peixoto também se interessou na realização da almejada construção do Hospital Central do Exército. Promovido por merecimento a Tenente Coronel, foi nomeado o primeiro diretor do Hospital do Exército (governo de Rodrigues Alves) e diretor de Saúde da Guerra, em 26 de dezembro de 1904. Criou o laboratório de bacteriologia do futuro Hospital Militar e a Policlínica Militar do Rio de Janeiro.

Fundou o Laboratório Bacteriológico Militar. Junto ao colega Dr. Paula Guimarães, alcançou a fundação desse Instituto do qual foi primeiro Diretor, tendo sido seu organizador central.

Em 1907, o Governo o comissionou para ir à França contatar professores de Veterinária para organizar, em bases científicas, o serviço de Veterinária do Exército. Por intermédio do Instituto Pasteur de Paris, contratou profissionais de notáveis serviços. Por indicação de Ismael da Rocha, fundou-se a Escola de Veterinária Militar. A Policlínica Militar do Exército e a lavanderia a vapor do Hospital Central foram criações suas, além da reorganização completa do quadro de Veterinários militares com profissionais competentes.

Fundou a Revista de Medicina Militar, confiando-a à Direção de seu competente colaborador o Dr. Bueno do Prado.

Foi Inspetor Geral de Saúde dos Serviços de Saúde do Exército, cargo no qual foram consideráveis as iniciativas para o melhoramento das condições materiais dos hospitais em diversas guarnições.

Não renunciou a sacrifícios pessoais para cumprir com o seu papel de médico e de Chefe do Serviço, sobretudo, em um período de importante transformação da aparelhagem e organização sanitária do Corpo de Saúde do Exército brasileiro.

Em 25 de maio de 1900, o Coronel-Médico Ismael da Rocha, bacteriologista do Serviço de Saúde do Exército; o médico Henrique de Figueiredo Vasconcellos, assistente do Instituto Vacínico; e o veterinário H. Carré, e um então estudante de medicina, Ezequiel Caetano Dias, fizeram parte do time de pesquisadores que inauguraram o laboratório na Fazenda de Manguinhos. Em pouco tempo, a Prefeitura transferiu para a Diretoria de Saúde Pública do Ministério da Justiça e Negócios Interiores a administração do laboratório, e foi reinaugurado oficialmente em 23 de julho como Instituto Soroterápico Federal. Pouco depois, Ismael da Rocha saiu da equipe e retorna para o laboratório do Exército.

Referências Bibliográficas

ACADEMIA NACIONAL DE MEDICINA. Ismael da Rocha. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://www.anm.org.br/ismael-da-rocha/.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Oswaldo Cruz. Ismael da Rocha. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://www.ioc.fiocruz.br/personalidades/ismael-da-rocha.

DANIEL-RIBEIRO, Cláudio Tadeu; SAVINO, Wilson. O Instituto Oswaldo Cruz: 115 anos de ciência para a saúde da população Brasileira. Anais do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, v. 13, p. 103-109, 2014. Disponível em: https://anaisihmt.com/index.php/ihmt/article/view/180.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Oswaldo Cruz
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Bacteriologia; Microbiologia; Soroterapia; Epidemiologia; Medicina Tropical; Medicina Sanitária; Urologia; Medicina Legal
Vínculo Institucional na Fiocruz
Fundador e Diretor do IOC (1900-1916)
Informações Biográficas

Oswaldo Gonçalves Cruz, ou simplesmente, Oswaldo Cruz, nasceu em São Paulo, na cidade de São Luís do Paraitinga, em 5 de agosto de 1872. Filho primogênito do médico Bento Gonçalves Cruz e de Amália Bulhões Cruz, teve cinco irmãs. Quando tinha apenas cinco anos de idade, a família mudou-se para o Rio de Janeiro, mais especificamente para o bairro da Gávea, então distante subúrbio carioca. Durante a infância e adolescência estudou no Colégio Laure, no Colégio São Pedro de Alcântara e no Externato Dom Pedro II. Seu pai, o carioca Bento Gonçalves Cruz, logo após a formatura em medicina, foi para o interior de São Paulo em busca de crescimento profissional, mas, em 1877, voltou para o Rio de Janeiro, onde montou consultório na própria residência e conseguiu um emprego no ambulatório da Fábrica de Tecidos Corcovado, situada no mesmo bairro. Anos depois foi nomeado pelo imperador Dom Pedro II, membro da Junta Central de Higiene. Em 1890, já sob o regime republicano, o pai de Oswaldo Cruz tornou-se ajudante do chefe da Inspetoria de Higiene, órgão que sucedera a Junta, chegando ao cargo de inspetor-geral. Porém, afastou-se da função devido a uma nefrite que o levaria à morte, com 47 anos, e por acaso, no mesmo dia em que filho se formava em medicina.​​​​

Oswaldo Cruz sofreu influência imediata do seu pai e de seus colegas médicos e cientistas. Eram em sua maioria, catedráticos no serviço sanitário, higienistas e do ramo da microbiologia. Inspirado, portanto, por esse contexto, aos quinze anos, iniciou seus estudos em 1887 na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Como acadêmico, foi preparador assistente no gabinete de física, sob a orientação do professor de física médica, João Martins Teixeira, e, posteriormente, estagiário do laboratório de bacteriologia do Departamento de Higiene, sob a chefia de Benjamin Antônio da Rocha Faria, função que lhe despertou maior interesse. Nessa época, montou um pequeno laboratório no porão de casa e contou com o apoio de seu pai. Antes mesmo de concluir o curso, publicou dois artigos sobre microbiologia na revista Brasil Médico.

Em 1892, formou-se em Medicina com a tese "A vehiculação microbiana pelas águas". Em 5 de janeiro de 1893, com vinte anos, casou-se com Emília Fonseca, filha de um próspero comerciante português, o comendador Manuel Fonseca. Assumiu, então, a clínica do pai no bairro da Gávea e também o cargo por ele ocupado no ambulatório da Fábrica de Tecidos Corcovado. O casal teve seis filhos: Elisa, Bento, Hercília, Oswaldo Filho, Zahra e Walter. Os três homens seguiram a trajetória do pai e cursaram medicina. Oswaldo e Walter trabalhariam futuramente no Instituto Oswaldo Cruz. Bento, o mais velho, não exerceu a profissão.

Através do auxílio financeiro do sogro, montou em casa um laboratório de análises e pesquisas. Nos dois anos seguintes, a convite do médico Egídio Sales Guerra (que anos mais tarde se tornaria seu médico particular e principal biógrafo), foi trabalhar na Policlínica Geral do Rio de Janeiro - uma instituição filantrópica criada em 1882 por iniciativa de médicos da Faculdade de Medicina – em um laboratório de análises clínicas que fornecia diagnósticos ao Serviço de Moléstias Internas, do qual Sales Guerra era chefe, e no Serviço de Dermatologia, dirigido pelo médico Antônio José Pereira da Silva Araújo. Neste último, passou a integrar, com Sales Guerra, Silva Araújo, Werneck Machado e Alfredo Porto, o “grupo dos cinco germanistas”, nome recebido devido ao empenho que tinham em aprender o alemão, com vistas a ter acesso aos estudos dos bacteriologistas germânicos.

Apesar de seu interesse pela bacteriologia alemã, em 1897 embarcou com a esposa e os dois primeiros filhos para Paris, com o objetivo de estudar microbiologia, soroterapia e imunologia, no Instituto Pasteur. Ao se matricular no Instituto, foi surpreendido ao ganhar uma bolsa de estudos do diretor, Émile Roux, por reconhecimento à ajuda financeira que o imperador Pedro II dera à instituição. Sempre mostrou interesse por estudos relacionados à doenças infecciosas e epidemias. Seus artigos fundamentavam-se não apenas na forte tradição higienista, prevalecente na Faculdade de Medicina, quanto na microbiologia, de Louis Pasteur e de Robert Koch.

Ao se instalar e se socializar no famoso instituto, aproveitou para se especializar também em urologia e medicina legal, pois naquele momento não havia especialistas nessas áreas no Brasil. Interessou-se pela confecção de ampolas, provetas e pipetas. Adquiriu os conhecimentos técnicos para a criação de utensílios fundamentais de laboratório, o que lhe tornaria pioneiro na fabricação desses instrumentos no Brasil, organizando alguns anos mais tarde, no Instituto Soroterápico Federal um serviço destinado a produzir esse tipo de vidraria. Adquiriu uma câmera em Paris capaz de fazer fotos estereoscópicas que produziam imagens com efeito tridimensional, montando um pequeno laboratório para revelação de fotografias em sua casa. Sua estada em Paris foi de dois anos e três meses, e em 1899 retornou ao Brasil.

Ao chegar, se deparou com um forte surto de peste bubônica. Reassumiu o cargo na Policlínica Geral e juntou-se à comissão de Eduardo Chapot-Prévost para estudar a mortandade de ratos que gerou o surto da peste em Santos. Diante das dificuldades de obter o soro antipestoso, produzido exclusivamente no Instituto Pasteur de Paris, as autoridades sanitárias fundaram institutos soroterápicos para a sua fabricação. Em São Paulo, sob a orientação de Adolpho Lutz e Vital Brazil, estabeleceu-se um laboratório vinculado ao Instituto Bacteriológico, mais adiante nomeado Instituto Butantan. Na capital federal, fundou-se o Instituto Soroterápico Federal, também chamado de Instituto de Manguinhos. Assim, Oswaldo Cruz foi convidado para assumir a direção técnica, sob o comando do Barão de Pedro Affonso, proprietário do Instituto Vacínico Municipal, com quem teve muitas divergências. Lá foi encarregado da produção do soro antipestoso junto com Henrique Figueiredo de Vasconcelos, seu companheiro de escola, e os estudantes de medicina Antônio Cardoso Fontes e Ezequiel Dias.

No Instituto Soroterápico, Oswaldo Cruz ampliou a fabricação de soro antipestoso e investiu na formação de novos pesquisadores. Em 1902, assumiu a direção geral do Instituto e no ano seguinte, chegou ao comando da Diretoria-Geral de Saúde Pública (DGSP), por nomeação do presidente Rodrigues Alves. Coordenou uma importante campanha sanitária de combate às principais doenças da capital federal: febre amarela, peste bubônica e varíola. Adotou o isolamento dos doentes, como principal forma de não proliferação de doenças, a notificação compulsória dos casos positivos, a captura dos vetores – mosquitos e ratos – e a desinfecção das moradias em áreas de focos. Desenvolveu campanhas de saneamento e, em poucos meses, a incidência de peste bubônica havia diminuído com o extermínio dos ratos. Contrariando a posição de médicos, cientistas e a opinião da população leiga, Oswaldo Cruz defendeu a teoria de que o transmissor da febre amarela era um mosquito. Assim, suspendeu as desinfecções, que era o método tradicional no combate à moléstia, e implantou medidas sanitárias com brigadas que percorreram casas, jardins, quintais e ruas, para eliminar focos de insetos. Sua atuação provocou violenta reação popular.

Com o aumento dos surtos de varíola, em 1904 o sanitarista tentou promover a vacinação em massa da população. No entanto, deparou-se com uma forte resistência da população e da imprensa, que pouco conheciam sobre os benefícios da vacina. O congresso protestou e foi organizada a Liga Contra a Vacinação Obrigatória. No dia 13 de novembro, estourou uma rebelião popular e, no dia 14, a Escola Militar da Praia Vermelha se levantou. O Governo derrotou a rebelião, que durou uma semana, mas suspendeu a obrigatoriedade da vacina. Mesmo assim, em 1907, a febre amarela estava erradicada do Rio de Janeiro. Em 1908, em uma nova epidemia de varíola, a própria população procurou os postos de vacinação.

Em 1905 foi iniciada a construção, na Fazenda de Manguinhos, do Pavilhão Mourisco, ou Castelo de Manguinhos, idealizado por Oswaldo Cruz, que foi concluído apenas em 1918, após seu falecimento.

Entre 1905 e 1906, Oswaldo Cruz empreendeu uma expedição a 30 portos marítimos e fluviais de Norte a Sul do país para estabelecer um código sanitário com regras internacionais. O reconhecimento internacional começou em 1907, quando Oswaldo Cruz recebeu a medalha de ouro no 14º Congresso Internacional de Higiene e Demografia de Berlim, na Alemanha, pelo trabalho de saneamento do Rio de Janeiro. Oswaldo Cruz ainda reformou o Código Sanitário e reestruturou todos os órgãos de saúde e higiene do país. Em missão diplomática, assegura ao presidente americano Theodore Roosevelt as boas condições sanitárias da capital federal. No ano seguinte retorna ao Brasil e é recebido como herói nacional.

Em 1907 o Instituto Soroterápico Federal passou a ser denominado Instituto de Patologia Experimental de Manguinhos e no ano seguinte recebeu a designação de Instituto Oswaldo Cruz. Com a sua equipe do Instituto Oswaldo Cruz (IOC) lançou importantes expedições pelo país e realizou o levantamento de suas condições sanitárias. Em 1910 fizeram uma importante campanha de estudos sobre malária que levou a morte de centenas de operários envolvidos na construção da Ferrovia Madeira-Mamoré. Também erradicou a febre amarela no Pará e realizou campanha de saneamento da Amazônia.

Em 1913, apesar de divergências de críticos, por não ser um intelectual da área literária, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.

Em 1914, em meio a Primeira Guerra Mundial, viaja com a família para Paris e retorna ao Brasil no ano seguinte. Os sintomas de sua doença renal, iniciados em 1907, tinham se acentuado. Ainda assim, correspondendo ao pedido do presidente Nilo Peçanha, trabalhou em um estudo de combate à formiga saúva, causadora de grandes prejuízos agrícolas.

Em 1915, foi aos poucos se distanciando do IOC, e firmou residência em Petrópolis, para tratar melhor de sua saúde. Como era muito jovem ainda, a família tinha receio de que a distância do trabalho pudesse lhe debilitar ainda mais, então, Bento, seu filho mais velho, utilizou da respeitabilidade de seu pai e pediu a Nilo Peçanha, que o nomeasse para a recém-criada prefeitura de Petrópolis. Em 1916, o sanitarista afastou-se definitivamente de Manguinhos, e em 17 de agosto do mesmo ano, tornou-se o primeiro prefeito da cidade. Tão logo tomou posse, preparou um plano de governo que incluía, entre outras metas, a construção de rede de esgotos e a organização dos serviços sanitários da cidade. Os carros de tração animal da prefeitura seriam substituídos por automóveis; uma linha circular de bondes elétricos ligaria os bairros de Petrópolis, e outra alcançaria o Rio de Janeiro; as margens dos rios ganhariam o azul das hortênsias; o ensino primário seria organizado; a educação física se tornaria obrigatória e parques seriam construídos para a prática de ginástica; por fim, seriam criados, no Palácio do Império, o Museu Imperial e Jardim Botânico.

Referências Bibliográficas

FUNDAÇAO OSWALDO CRUZ. A trajetória do médico dedicado à ciência. Disponível em: https://portal.fiocruz.br/trajetoria-do-medico-dedicado-ciencia.

FUNDAÇAO OSWALDO CRUZ. Biblioteca Virtual Oswaldo Cruz. Disponível em: http://oswaldocruz.fiocruz.br/index.php/biografia.

FUNDAÇAO GETÚLIO VARGAS. CRUZ, Osvaldo: médico, cientista e sanitarista. Disponível em: https://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/CRUZ,%20Osvaldo.pdf.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Lauro Travassos
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Helmintologia; Entomologia; Zoologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Pesquisador do IOC
Informações Biográficas

De origem portuguesa, teriam ido seus bisavós inicialmente para a Ilha Grande. Já em Angra, nasceram seus pais João de Matos Travassos e Laura Pereira Travassos. Nasceu em Angra dos Reis dia 2 de julho de 1890. Lauro Travassos se formou pela Faculdade de Medicina em 1913. Antes o colégio Alfredo Gomes. Em 1915 defende a tese intitulada: "Informações sobre os helmintes parasitos do homem encontrados no Brazil". Frequentou o Instituto de Manguinhos desde a época de estudante, onde depois passou a trabalhar para Gomes de Faria, dedicando-se especialmente à Helmintologia. Nesta especialidade, escreveu seus primeiros 181 trabalhos, passando então a dedicar-se também à Entomologia.

Em 1929 foi professor no Instituto Tropical de Hamburgo. Na verdade, com o crescimento do Instituto, o antigo laboratório de Helmintologia se transformou numa grande seção, integrante da Divisão de Zoologia médica. Estudou na Faculdade de Medicina e trabalhou num Instituto de Medicina Experimental, mas sua contribuição fundamental foi a zoologia.

Além disso, o seu grande espírito público dele fez dos mais acendrados colaboradores para o aperfeiçoamento de várias instituições, tendo sido notável sua contribuição ao Museu Nacional.

Em Manguinhos, Lauro Travassos trabalhou a maior parte de sua vida. Iniciou sua carreira científica a partir da participação no combate à febre amarela no Rio de Janeiro e em Belém. Travassos frequentou o Curso de Aplicação Instituto Oswaldo Cruz e trabalhou como estagiário no Laboratório de Helmintologia, sob a orientação de Gomes de Faria, com quem publicou, em 1913, uma monografia sobre ancilostomídeos, parasitos do intestino do homem causadores da ancilostomíase. Lauro Travassos participou, em 1912, da comissão que investigou as epizootias que flagelavam os rebanhos brasileiros na região de Botucatu (SP). Em 1915, acompanhou os trabalhos da Fundação Rockfeller, em Minas Gerais, relativos ao controle da ancilostomose. Em 1926, assumiu a cátedra de Parasitologia da Faculdade de Medicina de São Paulo. Em Manguinhos trabalhou durante toda a sua vida. Oswaldo Cruz abria espaço para qualquer tipo de ciência. Desde que fosse de qualidade. Era assim naquele tempo. E incorporou no seu trabalho, uma tradição que vinha do Museu Nacional. Do tempo do império, a zoologia. A sistemática. Ao longo de sua vida publicou 440 trabalhos sobre Helmintologia e Entomologia. Todos em português

Foi professor catedrático na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. As excursões realizadas pelo interior do Brasil ficaram famosas, resultando na criação da Coleção Helmintológica e em um grande intercâmbio nacional e internacional. Foi ainda membro da Academia Brasileira de Ciências.

Travassos simbolizou uma época, sobretudo levando-se em consideração as grandes dificuldades em fazer ciência, num país como o nosso. Pelo conteúdo de seus trabalhos, foi distinguido ao nível internacional com admiração de seus pares. E não só na Helmintologia, mas na Entomologia, especialidade a que também dedicou grande parte dos seus esforços. Abriu caminho no meio científico para quem tinha mérito, competência.

Embora suas publicações se refiram especialmente a sistemática, tinha conhecimentos vastos em Biologia e História Natural. Influenciou direta ou indiretamente novos caminhos.

Dos mais antigos e prestigiados cientistas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), pertenceu àquela geração formada pelos chamados discípulos de Oswaldo Cruz, o grupo pioneiro de Carlos Chagas, Arthur Neiva, Lauro Travassos, Henrique Aragão, entre outros.

Referências Bibliográficas

BATISTA, Ricardo dos Santos. A formação inicial de Antônio Luis Cavalcanti de Albuquerque de Barros Barreto: uma trajetória rumo à saúde internacional. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 26, n. 3, p. 801-822, jul./set. 2019. Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/zWMLWbKRCBnbmhcXQ67SMRK/?lang=pt#.

DALMEIDA, Jose Mario. Contribuições de Lauro Travassos (1890-1970) para a zoologia brasileira. História da Ciência e Ensino, v. 14, p. 88-99, 2016. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/index.php/hcensino/article/view/26753.

FERREIRA, Luiz Fernando. Lauro Travassos (1890 - 1970). Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 5, n. 4, p. 461-469, out./dez. 1989. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csp/a/Xy7KXjpxSpndzJHfhVq8KLS/?lang=pt#.

FUNDAÇAO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Base Arch: Fundo LT - Lauro Travassos. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://basearch.coc.fiocruz.br/fundo-lauro-travassos.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Oswaldo Cruz. Fiocruz-CHIOC: Coleção Helmintológica do Instituto Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://specieslink.net/col/Fiocruz-CHIOC/.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Oswaldo Cruz. Lauro Pereira Travassos. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=249&sid=77.

PAVILHÃO Lauro Travassos: caderno de memórias. Rio de Janeiro: Fiocruz/IOC, 2023. 1 vídeo (06min 56s), color. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/58941.

TRAVASSOS, Lauro Pereira; FREITAS, J. F. Teixeira de. Relatório da excursão científica realisada na zona da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil em Julho de 1939. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, v. 35, n. 3, p. 525-556, 1940. Disponível em: https://www.scielo.br/j/mioc/a/tt7q58tzCbTHQDJDt94bGLp/?lang=pt.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Carlos Chagas
Formação acadêmica
Farmácia e Medicina
Área de atuação
Medicina Sanitária; Infectologia; Bacteriologia; Medicina Tropical
Vínculo Institucional na Fiocruz
Pesquisador; Professor do Curso de Aplicação do Instituto Oswaldo Cruz; Diretor do Instituto Oswaldo Cruz (1917-1934)
Informações Biográficas

O texto completo elaborado foi retirado na íntegra do site da Biblioteca Virtual Carlos Chagas, disponível em: https://www.bvschagas.coc.fiocruz.br/php/.

Filho do cafeicultor José Justiniano Chagas e de Mariana Cândida Ribeiro de Castro Chagas, Carlos Justiniano Ribeiro Chagas, mais conhecido como Carlos Chagas, nasceu na Fazenda Bom Retiro em Minas Gerais, no município de Oliveira, em 9 de julho de 1878. Construída na segunda metade do século XVIII, a Fazenda Bom Retiro foi uma das primeiras propriedades estabelecidas em Oliveira, anterior ao povoado que daria origem à cidade. Com grandes extensões de terra, tinha como atividades principais a pecuária de corte e leiteira e o cultivo de cana-de-açúcar e café. José Chagas, seu pai, morreu, quando Carlos tinha apenas quatro anos. Após o infortúnio, sua mãe resolveu mudar com os cinco filhos para a Fazenda Boa Vista, próxima a Juiz de Fora, também no estado de Minas Gerais, para administrar de perto a sua produção.

Aos oito anos de idade, foi estudar no Colégio São Luís, na cidade de Itu, em São Paulo, um dos mais importantes e rígidos estabelecimentos de ensino do Brasil no século XIX, dirigido por jesuítas. No entanto, em 1888, ao saber que os escravos, estariam depredando as fazendas da localidade, devido a abolição da escravatura, fugiu da escola para encontrar sua mãe e acabou sendo expulso. Após o ocorrido, foi transferido para o Ginásio São Francisco, em São João Del-Rei, Minas Gerais, outra renomada instituição de ensino do estado de Minas Gerais.

Em 1895, ao finalizar o ensino secundário, sucumbe aos desejos de sua mãe e vai estudar Engenharia na Escola de Minas de Ouro Preto, tradicional centro de ensino superior. Contudo, pouco se dedicou aos estudos, se entregando aos hábitos boêmios e acabou adoecendo, motivo que o levou de volta para a casa da família. Nesta temporada em casa, obteve o apoio do tio médico e do avô, venceu a resistência da mãe e em 1897 mudou-se para o Rio de Janeiro, capital federal, para estudar medicina na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Naquela ocasião, a capital federal vivia um momento de grande efervescência. A proximidade do novo século intensificava a crença em um novo tempo, onde o Brasil, guiado pela ciência, poderia se tornar, enfim, uma nação “civilizada”, com as benesses de uma capital urbanizada e industrializada com a presença de luz, do telégrafo, do telefone e demais confortos e serviços.

Desde a década de 1880, vários professores da Faculdade defendiam que o ensino médico deveria incorporar os preceitos e práticas da medicina experimental, ou seja, da pesquisa no laboratório visando à produção de novos conhecimentos. Chagas, na universidade, se inspirou muito em seus mestres Miguel Couto, que lhe apresentou as noções e as práticas da clínica moderna, e Francisco Fajardo, que lhe apresentou o estudo de doenças tropicais, especialmente a malária, doença que seria importante objeto de estudo em sua carreira.

Em 1902, para elaborar sua tese, levou uma carta de recomendação de seu professor Miguel Couto, dirigindo-se ao Instituto Soroterápico Federal, na fazenda de Manguinhos, e entregando-a ao Dr. Oswaldo Cruz. Chagas elegeu como tema de seu estudo o ciclo evolutivo da malária na corrente sanguínea, e em março de 1903 concluiu a tese, o "Estudo Hematológico do Impaludismo".

Oswaldo Cruz, que assumiu simultaneamente a direção de Manguinhos e a Diretoria Geral de Saúde Pública, convidou Chagas para ser médico do Instituto, cargo que foi recusado por preferir, em 1904, trabalhar como clínico no Hospital Paula Candido, localizado em Jurujuba, Niterói, Rio de Janeiro. No mesmo ano, montou seu consultório no Rio de Janeiro e casou-se com Iris Lobo, filha do senador mineiro Fernando Lobo Leite Pereira, que conhecera por intermédio de Miguel Couto. Da união tiveram dois filhos - Evandro e Carlos Filho, que também se formaram em Medicina.

Em 1905, a Companhia Docas de Santos solicitou a Oswaldo Cruz, então Diretor Geral de Saúde Pública, providências para combater uma epidemia de malária entre os trabalhadores que construíam uma hidrelétrica em Itatinga, São Paulo. Carlos Chagas foi comissionado para coordenar a campanha. O cientista defendia a posição que, para evitar a propagação da doença em regiões em que não havia ações sistemáticas de saneamento, seria necessário concentrar as medidas preventivas nas moradias dos trabalhadores, onde estavam também os mosquitos infectados com o parasito da malária.

Estabeleceu muitas parcerias ao longo da sua trajetória. Em 1906, junto com Arthur Neiva, seguiu para Xerém, para organizar o saneamento na Baixada Fluminense, onde estavam acontecendo obras para a captação e bombeamento de água para o Rio de Janeiro. Com os resultados, Chagas confirmou a sua teoria da infecção domiciliar da malária.

Em 1908, Chagas e Belisário Penna, também médico da Diretoria Geral de Saúde Pública, partiram para o norte de Minas Gerais, em continuidade à campanha contra a malária. A epidemia paralisou as obras de prolongamento da Estrada de Ferro Central do Brasil no trecho entre Corinto e Pirapora. Desde sua inauguração em 1855, essa ferrovia era vista como um dos principais meios de integração do território nacional, fato que reforçou o empenho da equipe. Enquanto pernoitaram em um rancho, Penna observou e capturou exemplares de um inseto que já era conhecido dos engenheiros da Estrada de Ferro Central do Brasil. Era chamado popularmente de “barbeiro”, pelo fato de sugar o sangue de suas vítimas preferencialmente no rosto e à noite, enquanto estas dormiam. Segundo a descrição de Chagas, o barbeiro se alojava e se escondia nas frestas das paredes sem reboco e cobertas de capim de habitações pobres.

Chagas enviou alguns mosquitos barbeiros a Oswaldo Cruz, em Manguinhos. Depois de colocá-los para picar macacos criados em laboratório, este percebeu que alguns animais haviam adoecido e apresentavam tripanossomas no sangue. Chagas foi informado dos resultados das experiências. Voltando a Manguinhos, concluiu que o protozoário era uma nova espécie de tripanossoma, e o batizou de Trypanosoma Cruzi em homenagem a Oswaldo Cruz. A nota anunciando a descoberta do parasito foi publicada em 1909 na revista alemã “Archiv für Schiffs-und Tropen-Hygiene”. Oswaldo Cruz fez a divulgação pessoalmente do experimento de seu discípulo na Academia Nacional de Medicina. Em 26 de outubro de 1910, Carlos Chagas foi convidado a fazer parte da Academia Nacional de Medicina, mesmo com todas as cadeiras já ocupadas.

A Doença de Chagas passou a ser um dos principais temas investigados no Instituto Oswaldo Cruz. Carlos Chagas, com o auxílio de outros pesquisadores, passou a se dedicar ao estudo da doença em seus vários aspectos: as características biológicas do vetor e do parasito, os reservatórios do Trypanosoma Cruzi, as manifestações clínicas e a evolução da doença, os métodos de diagnóstico e possíveis formas de terapêutica.

Os trabalhos acadêmicos sobre a doença foram apresentados nas principais associações médicas do país e do mundo. Em 1911, na Exposição Internacional de Higiene e Demografia, em Dresden, Alemanha, a nova enfermidade despertou grande interesse. Em 1912, Chagas recebeu do Instituto de Doenças Marítimas e Tropicais de Hamburgo o Prêmio Schaudinn, de protozoologia. No ano seguinte, foi indicado ao Prêmio Nobel de Medicina. Na época, o governo federal garantiu recursos para a construção de hospitais, em Lassance e em Manguinhos, destinados a investigar a doença. A recém batizada moléstia tropical, passou então a ser vista no universo científico global, como "doença do Brasil", pois em vários sentidos simbolizava um país norteado pela doença e pela pobreza.

Após a morte de Oswaldo Cruz, em 1917, Chagas foi nomeado pelo então presidente da República, Wenceslau Braz, diretor do Instituto Oswaldo Cruz, cargo que ocuparia até o fim de sua vida. Seguindo o modelo implantado por Cruz, ampliou as atividades de pesquisa, ensino e produção, que continuaram em estreita vinculação com as demandas da saúde pública. Foram muitos os pesquisadores do Instituto, que se aperfeiçoaram no exterior incentivados pela diretoria de Carlos Chagas. A fim de conferir maior formalidade às áreas de trabalho, estabeleceu seções científicas: Bacteriologia e Imunidade, Zoologia Médica, Micologia e Fitopatologia, Anatomia Patológica, Hospitais e Química Aplicada. Em 1918, inaugurou o Hospital Oswaldo Cruz, destinado à internação de portadores de doenças infecciosas (entre elas a tripanossomíase americana) e as pesquisas clínicas.

No campo do ensino, Chagas ampliou o Curso de Aplicação de Manguinhos, oferecido desde 1908 para a formação de pesquisadores em microbiologia e zoologia médica. Diversificou e ampliou a produção de Manguinhos, estimulou a comercialização desses produtos, ampliando assim a renda própria que, desde o período de Oswaldo Cruz, era fundamental ao funcionamento do Instituto. Dentre tais produtos, destacava-se a vacina desenvolvida por Alcides Godoy para combater o carbúnculo sintomático ou “peste da manqueira”, que atacava o rebanho bovino. Uma medida fundamental para a expansão da área de produção foi a organização, em 1918, do Serviço de Medicamentos Oficiais, criado pelo governo federal com o objetivo de produzir e fornecer, gratuitamente ou a preços subsidiados, a quinina (profilático e terapêutico para a malária) e outros medicamentos. A partir de 1920, o Instituto assumiu também a responsabilidade pelo controle da qualidade dos imunobiológicos fabricados ou importados pelos laboratórios nacionais.

Chagas estabeleceu importante rede de relações com pesquisadores e instituições científicas de vários países, promovendo intercâmbios e cooperações. Em 1923, por exemplo, promoveu a criação do Instituto Franco-Brasileiro de Alta Cultura e a fundação da Sociedade de Biologia do Rio de Janeiro, filiada à Sociedade de Biologia de Paris.

Embora tenha sido prestigiado por assumir o papel que anteriormente fora creditado a Oswaldo Cruz, Carlos Chagas passou por inúmeras dificuldades devido ao cenário de turbulências da década da 1920. Recebeu muitas críticas devido à concorrência com outros produtores de imunobiológicos, a insuficiência das dotações orçamentárias do Instituto e a inflação, intensificada com a Primeira Guerra Mundial, que levou ao desgaste de sua infraestrutura e a desvalorização salarial de seus funcionários. Ainda assim, Chagas conseguiu manter alguns dispositivos fundamentais do modelo firmado por Oswaldo Cruz, como a autonomia financeira face ao orçamento federal, propiciada pela venda de produtos fabricados na instituição.

Carlos Chagas teve atuação de destaque nos debates e nas ações sanitárias sobre a saúde pública brasileira nas primeiras décadas do século XX. A sua célebre frase: “O Brasil é um imenso hospital”, fazia coro às denúncias de Euclides da Cunha quanto ao abandono dos sertões brasileiros, por parte do Estado. Alertou ao longo de sua carreira, para a importância que endemias rurais, como a malária, a ancilostomíase e a Doença de Chagas, fossem combatidas e o quanto isso era importante para o desenvolvimento do Brasil como nação, bandeira principal do chamado movimento sanitarista. No meio acadêmico, sempre afirmou que os estudantes de medicina deveriam preparar-se para lidar não apenas com as doenças urbanas comuns, mas principalmente com as enfermidades típicas do interior, que ao seu ver eram o principal motivo de preocupação para o país.

Chagas fez parte de uma campanha criada e dirigida por Belisário Penna - a Liga Pró-Saneamento do Brasil (1918-1920) - que reivindicava a intervenção do governo federal no campo da saúde pública. A campanha foi aderida por muitos políticos, cientistas e intelectuais.

Carlos Chagas assumiu, a convite do presidente da República Wenceslau Braz, a responsabilidade de comandar a assistência médica à população, na ocasião em que a pandemia da gripe espanhola chegou ao Brasil, em 1918. Providenciou a instalação de hospitais e postos emergenciais de consulta em diferentes pontos da cidade do Rio de Janeiro e, por meio da publicação de anúncios nos principais jornais, buscou a colaboração de seus colegas de profissão para o enfrentamento da epidemia.

No governo de outro presidente, Epitácio Pessoa, Chagas foi nomeado para a Diretoria Geral da Saúde Pública, transformada posteriormente em Departamento Nacional de Saúde Pública. Assumiu a direção concomitante ao seu posto em Manguinhos. Construiu um extenso código que modernizou a legislação sanitária brasileira e a estendeu ao interior do país, principalmente no que se referia ao combate às endemias rurais. Recebeu a importante colaboração da Fundação Rockefeller, que atuava no país desde 1916, na profilaxia da ancilostomíase e da febre amarela. Foi com o apoio desta Fundação que pôde ser criado em 1922 o Serviço de Enfermeiras, dirigido pela enfermeira norte-americana Ethel Parsons, a partir do qual fundou-se a Escola de Enfermagem Anna Nery. Os cuidados com a maternidade e a infância, a assistência hospitalar e o combate à tuberculose, sífilis e lepra foram também contemplados com serviços especializados.

Em 1925, foi nomeado primeiro titular da cátedra de medicina tropical da Faculdade de Medicina da Universidade do Rio de Janeiro, disciplina criada como parte da reforma do ensino superior implementada na ocasião.

Com o turbulento governo de Arthur Bernardes, Chagas deixou a direção do Departamento Nacional de Saúde Pública em 1926. O momento foi marcado por críticas, já que havia um surto de varíola na capital e um risco de uma epidemia de febre amarela. Clementino Fraga lhe sucedeu no cargo.

Foi representante brasileiro no Comitê de Saúde da Liga das Nações, a partir de 1922. No âmbito dessa associação, idealizou e dirigiu o Centro Internacional de Leprologia, inaugurado em 1934, com sede no Instituto de Manguinhos.

Referências Bibliográficas

BENCHIMOL, Jaime L. (coord.) Manguinhos do Sonho à Vida: a ciência na Belle Époque. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1990. 320 p.

BENCHIMOL, Jaime L. Dos Micróbios aos Mosquitos: febre amarela e a revolução pasteuriana no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, UFRJ, 1999. 501 p.

CARLOS Chagas. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, v. 38, n. 4, p. 251, 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/jbpml/a/X9Ksv66rVFHDL8WvV5D3Zhy/?format=pdf&la.

KROPF, Simone Petragli; LACERDA, Aline Lopes de. Carlos Chagas, um cientista do Brasil. Tradução: Diane Grosklaus Whitty. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009. 313 p. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/41343.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Biblioteca Virtual Carlos Chagas. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: http://www.bvschagas.coc.fiocruz.br/php/.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Invivo: Museu da Vida: Carlos Chagas, história. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: http://www.invivo.fiocruz.br/historia/carlos-chagas/.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Cezar Guerreiro
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Bacteriologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Médico Assistente; Pesquisador; Chefe de Serviço
Informações Biográficas

Cezar Guerreiro nasceu no dia 22 de agosto de 1885 em Belém do Pará. Filho de José Dias Guerreiro e Virginia Maciel Guerreiro.

Foi contratado, em 1 de março de 1911, para trabalhar nos serviços da Secção de Diagnóstico Bacteriológico e combate às Epizootias do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio.

Em 1914 foi para França trabalhar no Laboratório de Sangue de Montpelier.

Em 1917 foi nomeado assistente do Instituto Oswaldo Cruz em substituição a Arthur Neiva. Foi também interino na vaga deixada pela nomeação do Dr. Antônio Cardoso Fontes para Chefe de Serviço.

Em julho de 1918 voltou para França em missão médica.

De 1917 a 1940, substituiu diversas vezes o pesquisador Arthur Neiva, que colaborava com o Ministério da Agricultura.

Em 1925, Cezar Guerreiro foi colocado à disposição do Ministério do Exército para organizar, no Hospital Central do Exército, o serviço anátomo-patológico naquele órgão.

Patologista paraense e pesquisador do Instituto de Manguinhos, contribuiu para o avanço na detecção da Doença de Chagas, especialmente em sua fase crônica, a partir do desenvolvimento de um método de diagnóstico indireto da Doença de Chagas, conhecido por Guerreiro e Machado. A reação de Guerreiro-Machado foi um marco importante no diagnóstico da Doença de Chagas, e sua aplicação gerou resultados de importante impacto na saúde pública no século XX.

Funcionário da Seção de Diagnóstico Bacteriológico e combate às Epizootias do Ministério da Agricultura. Pesquisador do IOC, 1917-1940; Chefe de Serviço, 1931-1940.

Referências Bibliográficas

CARVALHEIRO, José da Rocha et al. (org.). Cezar Guerreiro & Astrogildo Machado - Da reação de Bordet e Gengou na moléstia de Carlos Chagas como elemento diagnóstico: nota preliminar. In: Clássicos em Doença de Chagas: histórias e perspectivas no centenário da descoberta. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009, p. 179-186. Disponível em: https://books.scielo.org/id/zb2bg/pdf/carvalheiro-9786557081013-10.pdf.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Cezar Guerreiro. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=152&sid=7.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Base Arch: Cezar Guerreiro. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://basearch.coc.fiocruz.br/index.php/cesar-guerreiro.

VIEIRA, Tamara Rangel. Médicos do sertão: pesquisa clínica, patologias regionais e institucionalização da medicina em Goiás (1947-1960). Rio de Janeiro, 2012. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/icict/17810/2/130.pdf.

Verbetes

Academia Nacional de Medicina
Pseudônimo ou nome de referência
Affonso Gama e Costa Mac-Dowell
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Tisiologia
Vínculo Institucional na Fiocruz
Pesquisador
Informações Biográficas

Nasceu em 13 de agosto de 1881, em Belém, no Estado do Pará. Filho de Samuel Wallace Mac Dowell e D. Ana da Gama e Costa Mac Dowell.

Graduou-se em 1905 na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (FMRJ), atual Universidade Federal do Rio de Janeiro, com a tese intitulada "Estudo das citoxinas do soro dos anêmicos por ancilostomíase".

A partir do quinto ano do curso de medicina passou a frequentar o Instituto de Manguinhos, tornando-se um discípulo de Oswaldo Cruz. Nessa época publicou seu primeiro trabalho científico "Um caso de meningite aguda por meningococo de Weichsebaun". Exerceu o cargo de médico efetivo do Hospital da Misericórdia e da Ordem 3º de São Francisco da Cidade do Belém no Pará (1905-1913), onde integrou a "Comissão Oswaldo Cruz", que erradicou a febre amarela.

Mesmo no exercício clínico contínuo suas pesquisas e como fruto de observações realizadas em Belém, no ano de 1909 publicou a obra: "O problema etiológico das desinterias". Publicou também "As anemias palustres", trabalho que revelou seu destaque nos estudos relacionados a medicina tropicalista. Quando Oswaldo Cruz chegou a Belém com o objetivo de erradicar a febre amarela, o convidou para integrar a "Comissão Oswaldo Cruz" para ser seu auxiliar e diretor do Serviço de Prophylaxia contra a febre amarela (1912-1913). A equipe conseguiu êxito e erradicou a doença na cidade.

Em 1914, já no Estado do Rio de Janeiro, tornou-se livre docente por concurso da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (FMRJ) onde organizou e desenvolveu seus cursos de semiótica e clínica médica.

Foi eleito Membro Titular da Academia Nacional de Medicina em 1916 com a memória intitulada "Da semiótica física de certos sinais da estenose mitral pura", ocupando a cadeira 11. Durante o período em que esteve na instituição exerceu o cargo de Presidente da Secção de Medicina no período de 1928 a 1937, 1942 a 1943 e 1946 a 1947. Transferiu-se para a classe dos Membro Emérito em 1942.

Dedicou-se exclusivamente a tisiologia sendo um dos pioneiros dessa especialidade no Brasil. Fundou o serviço de Tisiologia da Policlínica geral do Rio de Janeiro, que foi inaugurada em 17 de setembro de 1929 e foi diretor por muitos anos. Esse é considerado o ápice de sua carreira. Também criou a "Revista Brasileira de Tuberculose e Doenças Torácicas", importante referência no campo da tisiologia.

Foi membro de conselhos, sociedades e associações nacionais e internacionais, tais como membro e presidente da Sociedade Brasileira de Tuberculose, membro da Sociedade de Tisiologia do Uruguai e da Argentina, membro da Sociedade Mexicana de Estudos sobre a Tuberculose, membro da Sociedade Cubana de Tisiologia, membro da Sociedade de Tisiologia de Córdoba.

Foi distinguido com a presidência da Seção brasileira do "American College of Chest Physicians", sendo agraciado com a medalha Cardoso Fontes, que é outorgado aos grandes vultos da Tisiologia. No primeiro Congresso Nacional de Tuberculose sugere aos poderes públicos, como medida profilática, a obrigatoriedade do censo toráxico e a pesquisa da alergia profilática, a obrigatoriedade do censo toráxico e a pesquisa da alergia tuberculosa aos candidatos as escolas superiores do país.

Dedicou mais de trinta anos de profissão no estudo da Tisiologia brasileira sendo reconhecido pelo seus pares como um exímio profissional. Foi médico responsável por vários avanços da tuberculose no Brasil. Discípulo de Oswaldo Cruz, foi um importante expoente de seu estado no país e ficou conhecido no exterior como "sábio precoce".

Referências Bibliográficas

ACADEMIA NACIONAL DE MEDICINA. Affonso Gama e Costa Mac-Dowell. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: http://www.anm.org.br/affonso-gama-e-costa-mac-dowell/&gt.

BEGLIOMINI, Helio. Antigos membros da Centenária Academia de Medicina de São Paulo. São Paulo: Expressão & Arte Ed., 2021. 336 p. il. Disponível em: https://www.academiamedicinasaopaulo.org.br/wp-content/uploads/ANTIGOS-MEMBROS-DA-CENTENARIA-ACADEMIA-DE-MEDICINA-DE-SAO-PAULO.pdf.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Base Arch: Affonso Gama e Costa Mac-Dowell. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://basearch.coc.fiocruz.br/index.php/informationobject/browse?names=82144&topLod=0&query=affonso&sq0=affonso&sort=relevance&sortDir=desc.

MATSUMOTO, Harumi. Filantropia médica e assistência aos pobres: a trajetória da Policlínica de Botafogo. 2018. 129 f. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) - Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/33371.

MIRANDA, Aristoteles Guilliod de; ABREU JR, José Maria de Castro. Paraenses na Academia Nacional de Medicina. Norte Ciência, v. 2, n. 2, p. 55-59, 2011. Disponível em: https://repositorio.ufpa.br/handle/2011/4827.

NETO FRAIHA, Habib. Oswaldo Cruz e a febre amarela no Pará. 2. ed. rev. e ampl. Ananindeua, PA: Instituto Evandro Chagas, 2012. 174 p. il. Disponível em: https://patua.iec.gov.br/items/15269bed-57c6-4b96-80d8-7131284a24ad.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Arthur Neiva
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Entomologia Médica
Vínculo Institucional na Fiocruz
Instituto Soroterápico - 1906 / Pesquisador do IOC - 1908-1943
Informações Biográficas

Arthur Neiva, filho de João Augusto Neiva e Ana Adelaide Paço Neiva, nasceu em 22 de março de 1880, em Salvador, Bahia. Iniciou o curso de Medicina na Faculdade de Medicina da Bahia e o finalizou em 1903 na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, atual Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ), mesma universidade em que se tornou livre docente em 1914. Ainda, quando estudante, atuou na Inspetoria de Profilaxia da Febre Amarela, participando da campanha de erradicação do mosquito transmissor da doença, promovida a partir de 1903, por Oswaldo Cruz, Diretor-Geral de Saúde Pública.

Dois anos depois de formado foi nomeado por Oswaldo Cruz como auxiliar técnico do Laboratório Bacteriológico, no Instituto de Manguinhos, então Instituto Soroterápico, atual Fundação Oswaldo Cruz. Foi contemporâneo de cientistas como, Carlos Ribeiro Justiniano Chagas, Adopho Lutz, Henrique da Rocha Lima e outros que, mais tarde, teriam destaque internacional no cenário científico. Lá participou de campanhas de profilaxia da malária, realizou expedições científicas pelo interior do Brasil, boa parte financiada pelo Instituto Oswaldo Cruz e pela Inspetoria de Obras contra as Secas. Percorreu o norte da Bahia, o sudoeste de Pernambuco, o sul do Piauí e o Estado de Goiás desde o norte até o sul. Elaborou relatório demonstrando o estado de miséria que a população desses locais se encontrava. Chefiou uma campanha de saúde na abertura da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, cuja área era totalmente desabitada, coletando dípteros hematófogos para estudos. Foi com Monteiro Lobato, seu amigo, a uma expedição ao interior do Estado de São Paulo e Neiva encontrou nas bromélias locais o inseto transmissor da febre amarela. Incentivou a criação do Horto Oswaldo Cruz para plantas medicinais brasileiras que, em 1918, fez parte do Instituto Butantan. Foi responsável pela redação de um código sanitário semelhante ao código federal instituído por Oswaldo Cruz em 1903, e pela reorganização de um certo número de instituições científicas existentes, como o Instituto Butantan.

Em 1910, foi se aperfeiçoar em entomologia nos Estados Unidos. Chefiou em 1912, uma expedição ao interior da Bahia com Belisário Penna. Atuou no Instituto Bacteriológico de Buenos Aires entre 1915 e 1916, onde foi convidado para instalar a Seção de Zoologia Médica do Instituto de Bacteriologia de Buenos Aires.

Representou o Instituto Oswaldo Cruz em eventos nos Estados Unidos e em diferentes países da Europa, foi diretor do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo, quando elaborou o primeiro código sanitário brasileiro. Ainda em São Paulo, ficou conhecido pela campanha que realizou contra a broca-do-café, causada pelo inseto coleóptero Hypothenemus hempei que ameaçava a produção de todo o estado.

Atuou entre 1923 e 1927 como diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro e, posteriormente, foi diretor do Instituto Biológico de São Paulo. Além de médico, cientista e intelectual, atuou também no campo político, e, não por acaso foi convidado a ser interventor no estado da Bahia em 1931 e eleito representante de seu estado na Assembleia Nacional Constituinte de 1933, no qual ficou responsável pelo debate em torno da temática da saúde pública e do debate sobre imigração e colonização do território nacional. Neste último tema, mostrou-se favorável a imigração europeia, reforçando a polêmica proposta do branqueamento da sociedade brasileira.

Entre 1923 a 1927 dirigiu o Museu Nacional do Rio de Janeiro, e no ano seguinte tornou-se diretor-superintendente do recém-fundado Instituto Biológico do Estado de São Paulo.

Como Arthur Neiva tinha uma grande capacidade de negociação e mobilização políticas, fez de São Paulo um centro de pesquisa agrícola composto por nomes respeitados no cenário científico e atraiu cada vez mais pesquisadores do Rio de Janeiro, muitos provindos do Instituto Oswaldo Cruz.

Além da atuação como cientista, no Instituto de Manguinhos e, posteriormente, no Instituto Biológico de São Paulo, Neiva se caracterizou também como homem público, envolvido tanto com o mundo da ciência quanto no mundo político, tendo atuado como interventor federal na Bahia durante o governo provisório de Getúlio Vargas e como deputado federal da Constituinte de 1933-1934 e da legislatura de 1934-1937.

Foi por poucos meses, secretário de Interior do estado e logo em seguida foi nomeado por Vargas interventor federal na Bahia. No governo baiano, procurou desenvolver serviços sanitários, criou o Instituto do Cacau, mas não teve êxito na condução da política estadual. Assim, em agosto foi substituído por Juraci Magalhães.

De volta às atividades científicas, organizou vários institutos no Ministério da Agricultura. Em 1933 tornou-se diretor do jornal carioca A Nação, vinculado à corrente tenentista, e elegeu-se deputado federal constituinte na legenda do Partido Social Democrático (PSD) da Bahia. No ano seguinte renovou o mandato na Câmara e o exerceu até novembro de 1937, quando todas as casas legislativas do país foram fechadas pelo golpe que instaurou a ditadura do Estado Novo.

Neiva foi destacado para chefiar a campanha de saúde na abertura da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil - área inteiramente desabitada. Durante este período, realizou novas observações sobre dípteros hematófogos, enriquecendo as coleções do Instituto Oswaldo Cruz. O grande impacto de seu trabalho foi no campo da sistemática. Após visita a importantes coleções nos museus americanos e europeus, conseguiu exemplares-tipo para proceder a pesquisa comparada entre estes e os exemplares recolhidos por ele e Chagas. Iniciativa de grande relevância foi o incentivo que deu à criação do Horto Oswaldo Cruz destinado ao cultivo de plantas medicinais brasileiras, incorporado ao Instituto Butantan em 1918.

Além de médico sanitarista, cientista reconhecido internacionalmente, foi membro de entidades científicas no Brasil, na Argentina e nos Estados Unidos, atuou como deputado federal e interventor estatal durante o governo de Getúlio Vargas.

No Instituto Oswaldo Cruz, teve grande destaque na área da entomologia, principalmente nos estudos sobre anofelinos e outros culicídeos, nos quais identificou novas espécies, com a colaboração de César Pinto. Investiu também no estudo sobre bionomia e a sistemática desses insetos com atenção sobre a malária humana, então endêmica no Rio de Janeiro. na bionomia e sistemática dos triatomíneos conhecidos como "barbeiros", "chupões" ou "vinchunas", evidenciados nos trabalhos de Carlos Chagas como transmissores da tripanossomose americana.

Emprestou seu nome ao Pavilhão “Arthur Neiva”, projetado pelo Arquiteto Jorge Ferreira – Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, RJ, onde são realizados cursos, sendo construído em 1948/1951. Também, no Rio de Janeiro, a Rua Dr. Arthur Neiva em Duque de Caxias, Rua Dr. Arthur Neiva na Barra, Salvador Bahia, Rua Dr. Arthur Neiva, Butantan, São Paulo, SP; Escola Municipal de Ensino Fundamental “Arthur Neiva”, Jardim Helena, Guaianazes, São Paulo, SP, o homenagearam.

Arthur Neiva é presente também no saguão do prédio sede do Instituto Biológico. Foi uma homenagem por seu espírito empreendedor. Esse espaço, na verdade, representa todo o conteúdo histórico de uma instituição que lhe deve seu paradigma.

Saiba mais
Referências Bibliográficas

BORGMEIER, Thomas. Arthur Neiva: a propósito do seu 60o aniversário natalício. Revista de Entomologia, Rio de Janeiro, v. 11, n. 1-2, p. 1-104, 1940.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Casa de Oswaldo Cruz. Base Arch: Arthur Neiva. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://basearch.coc.fiocruz.br/index.php/fundo-arthur-neiva.

FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. Instituto Oswaldo Cruz. Arthur Neiva. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: http://www.fiocruz.br/ioc/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=147&sid=76.

LEAL, Rhaiane das Graças Mendonça. Nacionalismo militante: uma análise de correspondência de Monteiro Lobato e Arthur Neiva (1918-1942). 2020. 191 f. Dissertação (Mestrado em História das Ciências e da Saúde) – Casa de Oswaldo Cruz, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2020. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/44086.

PINTO, César. Arthur Neiva: cientista e homem público. Revista Médico-Cirúrgica do Brasil, Rio de Janeiro, ano 11, n. 1, p. 3-11. 1932.

REBOUÇAS, Márcia Maria. Arthur Neiva: o idealizador 1880-1943. São Paulo: Instituto Biológico, [2020?]. Disponível em: http://www.biologico.sp.gov.br/page/nossa-gente/arthur-neiva.

REBOUÇAS, Márcia Maria; BACILIERI, M. S. Arthur Neiva: o ideal acima de tudo. Inst. Biol., v. 1, n. 2, p. 1-3, jul./dez. 2005. Disponível em: http://www.biologico.sp.gov.br/uploads/docs/pag/V1_2/eeeee541-f7bd-45d3-97b5-70d11adc0460.htm.

SILVA, André Felipe Cândido da. Arthur Neiva, cientista, político e intelectual: novos elementos para a compreensão do processo de criação do Instituto biológico de cefesa agrícola (1927). Biológico, São Paulo, v. 69, n. 2, p. 107-111, jul./dez. 2007. Disponível em: http://www.biologico.agricultura.sp.gov.br/uploads/docs/bio/v69_2/p107-111.pdf.

SOUZA, Vanderlei Sebastião de. Arthur Neiva e a 'questão nacional' nos anos 1910 e 1920. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 16, supl. 1, p. 249-264, jul. 2009. Disponível em: https://www.scielo.br/j/hcsm/a/DSs9C4FSP4RSCnz9XjKkXLQ/abstract/?lang=pt#.

Verbetes

Base Arch/COC/Fiocruz
Pseudônimo ou nome de referência
Barão de Pedro Affonso
Formação acadêmica
Medicina
Área de atuação
Soroterapia; Patologia Cirúrgica
Vínculo Institucional na Fiocruz
Diretor Geral do Instituto Soroterápico Federal
Informações Biográficas

Pedro Affonso de Carvalho Franco ou Barão de Pedro Affonso, nasceu em Paraíba do Sul (RJ), em 21 de fevereiro de 1845, filho de Pedro Afonso de Carvalho e Luísa Helena de Carvalho. Licenciou-se em Letras pelo Colégio Pedro II aos 17 anos, continuou seus estudos na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro obtendo o título de doutor em 1869, em sequência especializou-se pela Universidade de Paris, retornando ao Brasil em 1872.

Ainda em 1872, o Dr. Pedro Affonso obteve a sua nomeação para a cadeira de patologia cirúrgica na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, tendo alcançado o 1º lugar em concurso para a cátedra, que ocupou por mais de 25 anos. O êxito em suas intervenções cirúrgicas trouxe-lhe grande popularidade e uma ampla atuação na área.

O Dr. Pedro Affonso, que era diretor do Hospital da Santa Casa da Misericórdia e desde 1878 vinha tentando reproduzir a vacina animal no combate à varíola, feito que só conseguiu realizar em 1887, após a vinda da polpa glicerinada do Instituto Chambon de Paris. Em 15 de setembro de 1894, pelo decreto número 105, fundou no Rio de Janeiro o Instituto Vacínico Municipal, no intuito de produzir a vacina antivariólica e promover a vacinação na cidade. Esta instituição funcionou até 1920, quando a vacina no combate à varíola passou a ser atribuição do Instituto Oswaldo Cruz, após uma reorganização do Departamento Nacional de Saúde Pública.

Pode-se de destacar ainda uma breve passagem do Barão na função de “conselheiro” de assuntos pertinentes à saúde pública, entre o fim do Império e o ano de 1902.

O Barão de Pedro Affonso foi protagonista na criação do Instituto Soroterápico Federal, hoje Fundação Oswaldo Cruz. Ao tomar conhecimento de telegramas vindos do Paraguai em junho de 1899, anunciando a presença da peste bubônica na América do Sul, a classe médica brasileira mostrou-se assombrada. Coube então ao Barão, a incumbência de importar dos institutos europeus um sortimento de soros e vacinas contra a peste, porém não tendo sucesso em suas investidas. Com as respostas do atendimento ter previsão de grande demora vindas de Berlim e Paris, o Barão vislumbrou como solução a instalação no Rio de Janeiro de um laboratório antipestoso.

Quando a peste bubônica eclodiu na cidade de Santos, o prefeito da capital federal, Cesário Alvim, não hesitou e por decreto de 19 de outubro de 1899 autorizou as despesas necessárias para a instalação, aparelhamento e custeio de um novo laboratório, como anexo do Instituto Vacínico Municipal sob a direção do próprio Barão. E assim, o Barão resolveu com rapidez sobre a escolha do local de estabelecimento do futuro laboratório, que depois de percorrer grande número de ilhas da Baía de Guanabara e outros lugares, pensou em instalar o laboratório na Quinta da Boa Vista. Porém, Luiz van-Erven, Diretor de Obras da Municipalidade, o convidou a visitar a fazenda de Manguinhos em Inhaúma, onde havia em construção fornos de incineração de lixo e assim foi escolhido o terreno para o futuro Instituto Soroterápico Federal.

O Barão manifestou o compromisso de assumir a direção do futuro laboratório, inclusive sem remuneração, com a condição de ter autonomia para a escolha do pessoal e assim convidou os técnicos doutores Ismael da Rocha, Oswaldo Cruz e Henrique Vasconcellos e mais dois alunos de medicina Antônio Cardoso Fontes e Ezequiel Dias. Além deste quadro de profissionais, foi autorizado pelo governo a contratação de um veterinário vindo da Europa.

Em 10 de dezembro de 1899 o Barão partiu para a Europa para aquisição do material necessário deixando as obras de construção dos laboratórios iniciadas e sob a fiscalização da prefeitura. Ao retornar em 28 de fevereiro de 1900 trouxe consigo o material e a contratação do bacteriologista Carré.

Com tudo pronto para começar as atividades do novo Instituto, deparou-se com um novo prefeito, Coelho Rodrigues, que se manteve contrário à sua instalação. O Barão manteve-se por meses tentando reverter a situação sem sucesso, com todos os instrumentos encaixotados e depositados em Manguinhos. E somente após a intervenção de Nuno de Andrade, diretor de Saúde Pública, que conseguiu convencer o Presidente da República, Campos Salles e o Ministro do Interior, Epitácio Pessoa, que o governo federal assumisse o novo Instituto, requerendo para si a Fazenda de Manguinhos. O Barão manteve-se da direção geral do Instituto Soroterápico até dezembro de 1902 quando pediu dispensa do cargo após divergências com Oswaldo Cruz, então diretor técnico.

Em relação ao seu título de Barão, por seu triunfo na clínica e no corpo diplomático, o Imperador do Brasil, D. Pedro II, lhe conferiu o referido título. O Barão de Pedro Affonso recebeu este título há dois meses e meio do fim do regime monárquico, em 31 de agosto de 1889, e durante este período não usufruiu do uso do título, fazendo questão de usá-lo somente após o advento da República.

Referências Bibliográficas

CATÃO, F. Barão de Pedro Affonso. Brazil Medico. 1920, v. 34, n. 46, p. 786 e 789.

FERNANDES, Tânia. Oswaldo Cruz X Barão de Pedro Affonso: polêmicas no controle de imunizantes. Cadernos da Casa de Oswaldo Cruz, 1989. v. 1, n. 1, p. 32-43.

INSTITUTO SOROTERAPICO FEDERAL. In: DICIONÁRIO Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930). [S. l.], [S. d.], Disponível em: https://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/scripts/

INSTITUTO VACÍNICO MUNICIPAL. In: DICIONÁRIO Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930). [S. l.], [S. d.], Disponível em: https://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/scripts/.

VASCONCELLOS. Francisco José Ribeiro de. Resgastes Petropolitanos [Barão de Pedro Afonso]. In: [SITE] Instituto Histórico de Petrópolis. [S. l.], [S. d.], Disponível em: https://ihp.org.br/?p=5585

ROCHA. Ismael da. Instituto Oswaldo Cruz. Brazil Medico, 1923, v. 49, n. 1, p. 82-83.

PEDRO Affonso de Carvalho Franco. In: [SITE] Academia Nacional de Medicina. Rio de Janeiro: Academia Nacional de Medicina, Rio de Janeiro, [S. d.], Disponível em: https://www.anm.org.br/pedro-affonso-de-carvalho-franco/.